Vítimas, familiares e a sociedade civil organizada, denunciaram ao Ministério Público Federal (MPF), nesta quinta-feira (29), em Santarém (PA), que casos de violência obstétrica no município são históricos, recorrentes e graves. As práticas são ainda mais frequentes contra famílias indígenas, de comunidades tradicionais, pobres ou negras, alertaram as famílias e especialistas.
As informações foram compartilhadas durante reunião pública promovida pelo MPF para discussão da violência obstétrica nas redes pública e privada do município. O objetivo da instituição foi o de levantar informações úteis para o aprimoramento e direcionamento de sua estratégia de atuação sobre o tema.
"Esse diálogo foi fundamental para que o MPF pudesse ter uma percepção bem realista de como está o atendimento às gestantes e às parturientes em Santarém, e às suas famílias", disse a procuradora da República Thaís Medeiros da Costa, que presidiu a reunião pública e que conduz um procedimento de acompanhamento das políticas públicas para a área no município.
Violações rotineiras – O descumprimento, pelo poder público, da obrigação de efetivar os direitos à gestação, parto e pós-parto humanizados acarreta uma série de violações de direitos humanos. Entre suas manifestações mais comuns estão o desrespeito à autonomia das mulheres, a recusa em seguir os planos de parto e a ocorrência de procedimentos invasivos e sem consentimento da gestante.
Dentre os pontos centrais discutidos, a falta de cumprimento das leis já existentes e a necessidade urgente de conscientização dos profissionais de saúde foram reiterados por diversas falas. Em relação aos povos originários, foi reivindicado que a efetivação dos direitos dessas famílias também deve passar pela construção de protocolos e estruturas que respeitem a identidade e cultura indígenas.
Precariedade estrutural – A reunião pública foi marcada, ainda, por manifestações de profissionais da saúde que denunciaram as condições precárias de trabalho e a falta de infraestrutura adequada para um atendimento humanizado.
Outro ponto alarmante levantado foi o atraso nas obras do Hospital Materno Infantil de Santarém/PA, que está em construção há 11 anos e ainda não foi concluído. A falta do hospital é um dos fatores que agrava a situação da saúde materna e neonatal, deixando as famílias em situação de ainda mais vulnerabilidade.
Em ação ajuizada em 2019, o MPF cobra que o município apresente um cronograma para a entrega das obras. O MPF destaca que Santarém necessita do Hospital Materno Infantil por ser polo da região oeste do Pará, recebendo demandas de outras 20 cidades vizinhas. O processo, de número 1000141-04.2019.4.01.3902, tramita na 2ª Vara Federal Cível e Criminal da Justiça Federal no município.
Demais relatos – Além das informações compartilhadas durante a reunião pública, vítimas e familiares puderam enviar relatos por meio de um canal extra que o MPF abriu para o evento, para reforçar o papel da instituição como espaço de escuta, acolhimento e proteção. Foi possível, inclusive, enviar relatos de forma anônima.
Após o evento, as pessoas seguem podendo enviar depoimentos para o MPF sobre violência obstétrica em Santarém por formulário na internet, no endereço www.mpf.mp.br/
Saiba mais – A violência institucional na atenção obstétrica, também chamada de violência obstétrica, é a violência cometida contra a mulher grávida e sua família na prestação de serviços de saúde, no atendimento pré-natal, no parto ou no aborto. Pode ser verbal, física, psicológica ou mesmo sexual, e se expressa de diversas maneiras, às vezes explícitas, às vezes veladas, explica a organização Parto do Princípio, especializada no tema.
No país todo, 45% das mulheres atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS) sofrem violência obstétrica. Em hospitais privados, a taxa é de 30%. Esses dados foram levantados em 2011 e 2012, na primeira fase do projeto Nascer no Brasil, a maior pesquisa sobre parto e nascimento já realizada no país, segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde.
Fonte: Agência Brasil