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MPF vai à Justiça contra obra ilegal na APP de Alter do Chão e pede suspensão de PL que busca reduzir zona de proteção

Mesmo afetando povo indígena e comunidades tradicionais de Santarém, não houve consulta livre, prévia e informada

Por Redação/Diário do Tapajós em 04/09/2024 às 14:21:05

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação na Justiça Federal para proteger e recuperar uma área de preservação permanente (APP) em Jacundá, no distrito de Alter do Chão, em Santarém, no oeste do Pará. A ação busca reverter irregularidades cometidas pelo Município de Santarém, pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) e por dois proprietários de edificação construída indevidamente.

Além da obra ter sido realizada em área de APP, também está em Merakaiçara, um terreiro sagrado do povo indígena Borari de Alter do Chão, desrespeitando tanto a integridade ambiental da região, quanto a cultura indígena, que tem conexão histórica e espiritual com essa área.

O MPF destaca que, com base em documentos e manifestações emitidos pela Semma, o Município já sabia da existência da área de preservação permanente antes de conceder as licenças para a obra. Apesar de ter recebido uma recomendação do MPF para corrigir a irregularidade, a secretaria optou por manter as licenças para a edificação na APP.

Além disso, parte da obra está situada na praia, que é bem público, de domínio da União e de uso comum do povo e, por isso, não poderia ter recebido autorização.

Em fiscalização realizada em abril deste ano, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) constatou a construção do imóvel na APP, inclusive sobre a praia, e o início do processo erosivo no entorno da obra, o que resultou na aplicação de multa ao responsável.

Regularização fundiária – Desde maio deste ano, a Prefeitura de Santarém tenta incluir Alter do Chão no Projeto de Regularização Fundiária Urbana (Reurb) do município – processo que já está em estágio avançado –, mesmo sem realizar consulta livre, prévia e informada às comunidades tradicionais, exigida pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), incluindo aos indígenas da etnia Borari, que há séculos vivem no local e já possuem estudos em trâmite na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

"Ao que parece, o Município de Santarém busca regularizar vários imóveis em Alter do Chão, com o objetivo de legitimar ocupações em áreas ambientalmente protegidas – como diversas áreas de preservação permanente localizadas na região – e, simultaneamente, desconsiderar o direito da comunidade indígena às terras tradicionalmente ocupadas, justamente porque visa legitimar a ocupação de terceiros não indígenas", detalha o MPF na ação.

Redução da área protegida – Após receber recomendação do MPF que orientava quanto à necessidade de demolição da obra realizada na área de preservação permanente e de conservação da área, o Município apresentou à Câmara Municipal Projeto de Lei Ordinária (PLO) que tenta reduzir, entre outras, a APP de Alter do Chão.

O mesmo PLO também visa legalizar todos os imóveis que foram construídos ilicitamente na Área de Preservação Permanente de Alter do Chão até 22 de julho deste ano, o que inclui o imóvel alvo da recomendação e da ação do MPF.

Para o MPF, além de demonstrar o descompromisso político da administração municipal com a proteção do meio ambiente, o projeto de lei representa um retrocesso ambiental significativo, apenas para consolidar e incentivar o avanço do setor de construção civil sobre a floresta e o território do povo indígena Borari.

Ao enviar o projeto de lei à Câmara Municipal, o Poder Executivo buscou reduzir a faixa de APP na área onde localizado o imóvel citado na ação para apenas 50 metros, de modo que a construção passaria a estar fora da APP. É quase como se o projeto de lei fosse criado para atender o interesse dos empresários após a ilegalidade ter sido detectada pelo MPF, destaca a ação.

Tendo em vista as inúmeras irregularidades identificadas, o MPF pede, entre outras providências, como medidas urgentes:

  • a suspensão e a anulação das licenças concedidas pela Semma para uso e realização de obras na área de preservação permanente;
  • a paralisação imediata, por parte dos proprietários, de qualquer obra ou intervenção na área do imóvel;
  • a demolição da obra e a retirada de qualquer item que faça parte dela, como cercas, equipamentos e materiais fincados no solo;
  • a recuperação ambiental de toda a área afetada;
  • a não concessão de autorização ou licença, pelo Município, para qualquer intervenção na área de preservação permanente, antes da realização de consulta livre, prévia e informada às comunidades tradicionais afetadas;
  • a suspensão imediata do programa Reurb de Santarém, no que diz respeito à Alter do Chão, assim como qualquer outro projeto que envolva o uso ou o parcelamento da área do distrito, sem que seja feita a consulta livre, prévia e informada;
  • a suspensão imediata do PLO, até que seja realizada consulta prévia, livre e informada ao povo indígena Borari e às demais populações tradicionais afetadas.

Na ação, o MPF também pede à Justiça que exija o mapeamento detalhado das áreas ilegalmente ocupadas ou construídas na Área de Preservação Permanente de Alter do Chão, com foco especial na região do Jacundá (Merakaiçara), e indica a necessidade de implementação de um programa abrangente de educação ambiental em escolas e creches de Alter do Chão, com o objetivo de conscientizar sobre a importância da preservação das áreas de proteção e prevenir novas ocupações ilegais.

Providências para toda a região – O MPF reforça que é fundamental que os cuidados indicados para o caso da Área de Preservação Permanente de Alter do Chão sejam considerados para todos os processos de concessão de licença de obras que possam afetar, direta ou indiretamente, povos indígenas e comunidades tradicionais, estejam esses em andamento ou solicitados futuramente.

Sobre a constante violação de direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, o MPF reafirma "que esses grupos, ao longo da história, foram marginalizados e afastados dos processos de tomada de decisão, sujeitando-se a imposições administrativas e legislativas que inviabilizavam a própria continuidade de sua existência".

Fonte: MPF

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